segunda-feira, 13 de abril de 2015

Discutindo Física: Grandes Laboratórios, Prof. Luiz Vitor de Souza Filho


No dia 13 de Abril de 2015 o grupo PET-LiF realizou mais uma palestra do Projeto "Discutindo Física”.

O palestrante da vez foi o professor Luiz Vitor de Souza Filho, que é pesquisador do IFSC (Instituto de Física de São Carlos) da USP. Pesquisador em Astrofísica de partículas, o professor Vitor participa de pesquisas em vários laboratórios internacionais, e nos contou como funcionam essas grandes colaborações.

O público presente pode ficar por dentro de como é participar de uma colaboração internacional como o Observatório Pierre Auger, que fica na Argentina, é um observatório que está em funcionamento há 10 anos e conta com 17 países membros, e 400 pesquisadores mais ou menos.  Outra colaboração que o professor Vitor participa é o CTA, que é uma sigla em inglês para Cerenkov Telescop Array, que possui 27 países membros e 1300 colaboradores. 

 Foram discutidos os tipos de pesquisa com radiação cósmica que ocorrem nessas colaborações, que tipo de funções um pesquisador pode exercer estando com um laboratório em um país distante da sede e como é a interação com outros cientistas.


A palestra foi esclarecedora já que muitos dos ouvintes pretendem seguir carreira de pesquisa na Física e buscam grandes projetos onde possam contribuir com seu trabalho.

Com as discussões foi possível concluir que esse tipo de trabalho com Física básica é fundamental, pois tem o objetivo de descrever um fenômeno da natureza que ainda não entendemos, e com esses conhecimentos, os pesquisadores um dia podem chegar a conclusões fascinantes e aplica-los para o desenvolvimento da sociedade humana.
 Ficamos muito satisfeitos com esse Discutindo Física e acreditamos que todos os envolvidos também. Muitos pegaram o contato do professor para possíveis parcerias no futuro.

Gostaríamos de agradecer mais uma vez ao Professor Vitor pela participação e aos alunos que compareceram e fizeram com que nosso evento fosse um sucesso: muito obrigado!



domingo, 12 de abril de 2015

Na íntegra : Entrevista com o astrofísico de partículas, Profº Dr. Luiz Vitor de Souza

PET-LiF: O News Bohr tem como proposta divulgar um pouco da física para o departamento, com assuntos não muito falados em aula, para maior interação das pessoas. Nessa edição a gente resolveu pegar grandes centros de pesquisa mundiais, pois as pessoas se interessam muito por pesquisa, e lógico, surgiu o CERN como foco, mas a gente acabou pesquisando sobre seu trabalho, e vimos que o sr. tem relação com o KASCADE. Como é o seu trabalho?


Vitor: Em grandes colaborações, grandes centros de pesquisa, eu sou membro de três. O KASCADE é a menor delas, com 20 e poucas pessoas, e é um experimento que já acabou, operou durante 20 anos, tomou dados muito importantes e dois anos atrás se encerrou, agora tem só alguns alunos tomando análise de dados, e depois disso o experimento está encerrado. Os dois experimentos que ainda participo, um chama Observatório Pierre Auger, que fica na argentina, é um observatório que está em funcionamento há 10 anos agora, e conta com 17 países membros, e uns 400 pesquisadores mais ou menos. A outra colaboração que eu participo chama CTA, que é uma sigla em inglês para Cerenkov Telescop Array, um conjunto de telescópios de Cerenkov, e é maior ainda, tem 27 países membros e 1300 colaboradores. Eu desde o começo da minha carreira participo de grandes colaborações, então sempre estive envolvido nessa dinâmica de experimentos e colaborações que envolvem milhares de pessoas. Não sei se esse é o foco que querem dar para a reportagem, mas é verdade que a ciência feita por esses grandes centros tem particularidades na maneira de proceder. Colaborações desse tamanho são formadas por serem necessárias, não dá para fazer o trabalho de um observatório ou um detector de partículas exige se não tiver um grande número de pessoas trabalhando. São duas necessidades, uma de dinheiro, pois eles custam muito caro, então pra você construir você precisa de muita gente financiando, e ao mesmo tempo de mão de obra, os resultados que saem desses laboratórios precisam de um detector muito grande e de muita gente para analisar esses dados. Então você precisa de gente e de muitas instituições para financiar essas colaborações. Exige do pesquisador que trabalha nessa área uma dinâmica de grupo muito maior do que de um pesquisador que trabalha sozinho na sua área ou mesmo de um experimental que trabalha no seu laboratório na sua universidade. Essas colaborações tem uma estrutura semelhante a um país. Existem órgãos executores, assembleias com representação de todos os partidos membros, usam o nome partido, esse partido tem um representante para um órgão deliberativo, como uma câmara dos deputados. O resultado que sai de uma colaboração dessas tem um escrutínio muito maior do que um laboratório de um professor. Nunca algo é levado a publico se não é feito por pelo menos dois grupos independentes com duas analises independentes, então os trabalhos demoram muito mais para serem publicados, pois ficam em um tempo de gestação dentro da colaboração que o grupo que fez apresenta, é analisado se tem valor, é levado para um segundo grupo fazer analise daquilo, até que o resultado ganha confiança da colaboração a ponto de ser divulgado numa revista internacional. Em geral você trabalha com muita gente de muitas nacionalidades, o que é uma exigência também dessas colaborações, invariavelmente temos chamadas por computador, tipo Skype, tem muitas outras tipo Skype, com pessoas do mundo inteiro. Eu sempre faço chamadas com um grupo de trabalho dentre desse observatório Pierre Auger que é da argentina, tem um pesquisador chave que está na Austrália, outro na Alemanha, eu aqui e outro nos EUA, então tem gente em todos os fusos horários, tem gente no meio da noite, no meio da tarde, na manhã e indo dormir participando da reunião, e elas acontecem com frequência. To dando esses exemplos para mostrar que a dinâmica é completamente diferente de um pesquisador solitário e sua pesquisa.

PET-LiF: Como você se envolveu com esses projetos internacionais, foi a partir do IFSC ou uma alternativa própria?

Vitor: Eu me envolvi com meu primeiro projeto internacional, que foi o observatório Pierre Auger quando ele ainda não existia. Isso é antes de 10 anos atrás, pois fiz meu doutorado na UNICAMP, a liderança desse observatório estava lá na UNICAMP, e os professores da UNICAMP levaram o Brasil a participar desse experimento. Então foi meio que natural, eu sempre gostei de astrofísica, era algo que me chamava atenção na graduação, e o único grupo que trabalhava com astrofísica na UNICAMP era esse grupo de astrofísica de partículas que tava pesadamente envolvido com o observatório Pierre Auger, projeto, construção, etc. Eu me envolvi aí, quando começou a ser projetado, e continuo até hoje lá. No CTA foi iniciativa minha mesmo, quando fui contratado aqui no IFSC, vim da Alemanha para cá, e comecei a procurar um experimento internacional da mesma área que representasse uma nova fase dessa carreira, meu grupo entrando nesse experimento, e o que mais me chamou a atenção, pelo potencial de descoberta que ele tem, foi o CTA que é um experimento muito interessante, e eu propus a entrada do Brasil no CTA, faz cinco anos, o Brasil foi aceito como membro dessa colaboração, eu saí dando seminários no Brasil sobre o experimento, tentando congregar mais gente, formar um grupo em volta do experimento, e tudo deu certo, somos em torno de 20 pessoas no Brasil membros do CTA contribuindo cada um com um aspecto diferente.

PET-LiF: Seu trabalho é com física de partículas, quais são as pesquisas que o Sr. desenvolve?

Vitor: Costumamos colocar um ASTRO na frente do nome, astrofísica de partículas, física de partículas, ou astro física feita com partículas. Você pode ver o trabalho que faço e que meu grupo faz, por dois lados, dois pontos de vista. Se olharmos o ponto de vista “astro” é tentar entender o que são os objetos do universo, como funcionam, detectando as partículas que eles emitem. Todo objeto do universo emitem, além de luz, partículas, prótons, neutrinos, núcleos de átomos, pode emitir núcleo de ferro, nêutrons, varias saem desses objetos, medimos elas na terra e tentamos entender como elas são produzidas, qual o mecanismo que opera dentro de uma supernova ou no limite de um buraco negro, que faz com que eles gerem partículas com as propriedades que a gente mede aqui na terra, energia, direção, tipo, o que acontece lá? Essa é a visão astro do que eu faço. Se olhar a visão partícula do que eu faço, eu diria o seguinte, a gente usa um acelerador de partículas que não ta aqui na terra para estudar a interação de partículas. Quando essas partículas chegam à Terra, elas interagem com átomos na atmosfera e geram um efeito em cadeia, um jato, muito parecidos com aquelas fotos que vocês vem nos detectores do LHC, aqueles jatos indo pra lá e pra cá. Isso acontece na nossa atmosfera, caem na nossa cabeça o tempo todo, essas partículas, a gente constrói um detector no chão que medem a partícula passando, e a gente tenta estudar as interações que aconteceram na atmosfera, a gente consegue fazer isso, usando esse viés de partículas, em energias impossíveis de serem produzidas num acelerador terrestre. A energia do LHC está em torno de mil vezes menor do que as partículas que a gente consegue medir de radiação cósmica, desses aceleradores fora da terra, então a gente consegue ter acesso a informações de interação de partícula que nós nunca vamos conseguir fazer nesse acelerador de partículas, porque não da, a gente não tem tecnologia pra fazer um acelerador de partículas com mil vezes mais energia do que o atual LHC. Então tem esses dois vieses, eu posso pegar a partícula que ele entendeu que tá no objeto, ou eu posso dizer que não estou interessado nesse objeto astrofísico, eu pego essa partícula perto de mim e vou estudar ela aqui, como se fosse num acelerador que ta dentro do buraco negro e te manda a partícula de graça, sem ter que construir seu anel LHC. E mais nos detalhes, a gente faz isso com os dados dos observatórios que a gente coleta, traz pra cá, analisa aqui no IFSC, e além de analisar os dados desse observatório que eu sou membro, a gente faz também dum lado mais teórico ou fenomenológico. Sem usar os dados podemos inventar modelos que tentam descrever o que os observatórios medem. A gente faz modelos tanto das fontes, quanto da propagação da fonte até aqui, pra tentar descrever como o objeto funciona.

PET-LiF: Apesar de ter falado que o LHC não tem tanta potencia, esse tipo de pesquisa se comunica com o CERN de alguma forma?

Vitor: Se comunica bastante com o CERN, porque não é a mesma física, não é uma física que compete, não competimos os resultados do LHC, mas é completamente dependente. Tudo que a gente faz depende do que é medido no LHC, a gente usa os dados do LHC para fazer uma modelagem para uma energia maior, a gente faz uma extrapolação dos dados do LHC. Tudo que é medido lá de propriedade de partícula, sessão de choque, inelasticidade, propriedades de interação de partículas, vai até uma energia, a gente usa o que o LHC mede até ali e a gente precisa ir além, porque nossa energia ta mais acima, então a gente extrapola a medida, e as vezes a gente faz uma medida, por exemplo, a gente mediu a sessão de choque que é a probabilidade de interação de um próton com um átomo, a gente pode medir isso, e o LHC mede também, mas o LHC mede isso numa energia mil vezes menor do que a gente mede então a gente tem um gráfico publicado no Physics Review Letter que junta no mesmo gráfico um ponto medido no LHC e um ponto medido no observatório Pierre Auger. É a mesma propriedade medida pelos dois experimentos só que com maneiras de medir completamente diferentes. O LHC consegue fazer um estudo das partículas muito mais detalhado que esse observatório consegue fazer. As interações do LHC tão num ponto bem fixo do espaço, e eles enchem em volta desse ponto uma centena de detectores para medir todos os detalhes dessa reação, com uma precisão de medida muito melhor. A gente não tem esse controle, a interação acontece em qualquer lugar na atmosfera pra gente, a gente não consegue saber onde ela vai acontecer, e a informação que a gente vê é muito mais diluída do que a informação que o LHC tem então a gente não consegue fazer uma física de interação de partículas com tanta precisão quanto o LHC faz, mas a gente consegue dados muito menos precisos numa energia muito maior, então dessa forma as pesquisas se tocam, mas não estão relacionadas, não tem o mesmo objetivo. O LHC, por exemplo, não tem nenhum viés astro que a gente consegue fazer no observatório. O observatório Pierre Auger é um experimento associado do CERN. O CERN é uma instituição que tem experimentos locais, mas ela também tem associação com outros experimentos, que são experimentos que tem sobreposição de interesses, o CERN coloca embaixo do guarda chuva esses experimentos, e o observatório é um deles. Alguns encontros do observatório foram feitos dentro do CERN já, usando o espaço físico deles, e aí as pessoas se comunicam, quem é dos experimentos do CERN acabam vendo nossas reuniões. Tem muitos pesquisadores no observatório, por exemplo, que também são membros de um experimento do CERN, fazem essa ponte, eles medem coisas no CERN e fazem a transposição daquilo pro que a gente usa em astrofísica de partículas. São especialistas em fazer essa comunicação entre os dois tipos de experimento.

PET-LiF: Em relação a precisão das medidas, como é dada a medida das interações das partículas no observatório?

Vitor: A gente não mede uma interação, a gente nunca consegue medir uma interação como acontece no CERN. No CERN tem uma colisão e sai um jato, eles medem os resultados dessa colisão. No observatório Pierre Auger, no CTA também é assim, tem uma cadeia de interações, e a gente mede o resultado dessa cadeia de interações, e você tenta reconstruir o que aconteceu na primeira reação, é uma medida muito indireta, não é uma medida direta como o LHC faz. No chuveiro de alta energia, a gente chama de chuveiro, pois ele lembra muito um chuveiro, esse jato de energia parece um jato d’água caindo, esse chuveiro gera da ordem de 10^10 partículas no chão, que o observatório mede. O que a gente mede é uma amostragem pequena dessas partículas no chão. Então a gente faz um trabalho de simulação computacional pra tentar reconstruir a partir do que a gente mediu, e estudar as propriedades dessa interação que aconteceu. Não é nada direto e difícil pra caramba de fazer, não é um calculo imediato, envolve muita computação e muita gente tentando cercar essas possibilidades que esse chuveiro teria desenvolvido.

PET-LiF: A gente sabe que o sr. estudou em campinas, e não muito conhecido, mas tem o Sincrotron lá, o sr. sabe algo sobre esse projeto, existe alguma relação?

Vitor: Não existe nenhuma reação, e eu sei do Sincrotron como visitante, quando eu tava na UNICAMP a gente sempre ia visitar o Sincrotron então eu sempre ouvia falar em seminários. A diferença do Sincrotron é a seguinte, ele não colide partículas, não quer estudar interação entre partículas, ele usa partículas para gerar luz, e ele usa a luz para estudar o que você quiser, pra fazer uma espectroscopia de raios-X de uma molécula, um cristal. Ele tem um anel, e por isso a gente acha que faz a mesma física, pois o LHC tem um anel também, no LHC o anel acelera as partículas, aumenta a energia dela e dentro do detector faz as partículas colidirem e estuda essa colisão. O Sincrotron joga as partículas no anel e deixam rodando lá, na verdade ele joga elétron, ele só joga elétron lá, e as partículas não colidem, ele não quer ter colisão, porque a colisão destrói a corrente, as partículas andando ali, ele evita as colisões, deixa a partícula andando ali, e a partícula acelerada emite radiação, o efeito clássico do eletromagnetismo, eles fazem o elétron fazer uma curva e o elétron emite radiação, e eles coletam essa radiação num feixe, e a propriedade do Sincrotron é que ele consegue fazer esse feixe com muita luminosidade, então a intensidade de luz que sai do feixe é muito alta, e muito monocromática com um comprimento de onda muito bem determinado. O Sincrotron é uma fonte de luz, é uma fonte de luz maravilhosa, com alta intensidade, monocromática, completamente controlada, constante, que você pode fazer o experimento por muito tempo, porque as partículas ficam girando lá muito tempo e o feixe de luz fica continuo em operação. Então você usa esse feixe de luz pra analisar alguma coisa, você põe alguma coisa na frente do feixe luz e faz medidas com a radiação que sai dali.

PET-LiF: Ele seria então mais voltado para outras aplicações em outros experimentos?

Vitor: Isso, o Sincrotron é uma fonte de luz, igual um gerador de raios-X, um gerador de microondas, ele gera luz, mas é um gerador de luz com qualidade fantástica, e um acelerador de partículas é um colisor de partículas, ele acelera partículas pra fazer elas trombarem, pra estudar essa colisão.

PET-LiF: Para finalizar, qual o sr. acha que é a importância das pesquisas que o sr. mesmo faz, do CERN ou outros centros, qual a importância para o desenvolvimento da ciência, nessas pesquisas?

Vitor: Eu acho que a importância é fundamental, tanto o LHC quanto os experimentos de astropartículas que eu participo são experimentos de ciência básica, por ciência básica quero dizer o objetivo de descrever um fenômeno da natureza que a gente não entende. Isso está desvinculado com a aplicação desse conhecimento. O objetivo do estudo que eu faço, que o LHC faz, é desvendar o mistério que a gente sabe que existe na natureza. O LHC queria explicar qual é o mecanismo que gera massa, a gente sabe que ela existe, descreve, usa ela pra tudo que a gente faz, mas desconhecia o mecanismo. A ultima medida do LHC, principal medida do LHC até hoje, que é a medida do Bóson de Higgs desvenda o mecanismo de geração de massa. E isso é a mesma coisa com a astrofísica de partículas, a gente recebe partículas vindo aqui, do universo, do cosmo, e não conseguimos explicar como foram produzidas. Eu tinha um professor na UNICAMP, Carlos Escobar o nome dele, ele sempre falava que “a curiosidade humana nunca decepcionou”, e ele queria dizer o seguinte, toda vez que a humanidade fez um esforço pra entender algo fundamental da natureza, num futuro a humanidade aprendeu a usar esses conhecimento pra alguma coisa, o exemplo mais trivial disso é que quando o eletromagnetismo foi estudado eles nem podiam imaginar que 100 anos depois a humanidade não viveria sem esse conhecimento. Hoje se acaba a energia elétrica, a bateria do celular, você não sabe o que fazer, parece que o mundo acabou, faz só cento e poucos anos que o conhecimento que possibilitou isso foi gerado, e quando eles estudaram isso eles queriam saber como o elétron anda como um capacitor guarda energia dentro dele, era uma coisa muito rudimentar e muito de ciência básica. Como eu escrevo os fenômenos eletromagnéticos dentro de uma teoria consistente? O ultimo passo pra fazer isso foi feito pelo Maxwell, fazendo as quatro equações juntando todo o conhecimento do eletromagnetismo até então. Com aquilo nós podemos explicar todos os fenômenos do eletromagnetismo que temos hoje, mas quando ele fez aquilo ele não tinha a menor ideia do que aquilo ia possibilitar a curiosidade deles por uma coisa muito básica, muito fundamental, faz hoje nós termos tudo no nosso dia a dia, é assim que a ciência funciona claro que existem exemplos negativos também, existem conhecimentos científicos que foram desenvolvidos e não levaram a nenhuma aplicação, só que você nunca sabe, fazendo a pesquisa básica, quais vão levar ou não. Os países, ou sociedades que tiveram coragem de investir na ciência que estudava as questões fundamentais são as sociedades que dominam todas as tecnologias, eles não começaram o conhecimento tecnológico que a gente tem hoje estudando aplicação, começaram com ciência básica, descobrindo os fundamentos da natureza que regem aquilo, e só as pessoas que dominam os fundamentos básico que vão conseguir fazer aplicações depois. Sem esse conhecimento básico o avanço em si não é possível e quem não tem não sabe fazer, então nosso objetivo, de quem faz astrofísica de partículas, é o de ciência básica. Esses experimentos em si eles tem outra característica que é mais imediata que outras pesquisas, que é a necessidade de fazer um instrumento sofisticado. Os instrumentos utilizados no LHC e em astrofísica de partículas são em si um desafio de engenharia, um desafio tecnológico, muitas vezes. O LHC tem regiões imensas com temperatura mais baixa que a do espaço vazio. Isso foi um desenvolvimento tecnológico incrível, conseguir manter regiões com menos que 2,7K, algumas regiões são 1,5k no LHC, foi um desafio imenso, e esse desafio faz um avanço imediato em alguns pontos tecnológicos. O mesmo em astrofísica de partículas, nós temos no observatório Pierre Auger a maior rede de celulares operando. Temos 1600 detectores espalhados numa área do tamanho da cidade de São Paulo se comunicando por antenas. Há 10 anos atrás isso não era nada trivial de fazer. Esses detectores parecem uma caixa d’água imensa, ele é autônomo, tem uma bateria, um painel solar, uma central de aquisição de dados e uma anteninha que fica mandando sinal o tempo todo. São 1600 desses, como se tivessem 1600 celulares se comunicando ao mesmo tempo nessa rede. Foi um trabalho fazer com que isso funcionasse e ta funcionando a 10 anos, mandando dados pro observatório. Ele tem esse problema tecnológico imediato, que leva a uma consequência social. As pessoas envolvidas nesses experimentos não conseguem fazer isso dentro da universidade só, fazem isso com empresas parceiras no país que faz o equipamento. Pro observatório nós construímos vários equipamentos no brasil. as empresas que fizeram esses equipamentos tiveram o seu faturamento e o emprego de todo mundo que trabalhou lá garantidos por um experimento cientifico. E eles aprenderam muito, pois os critérios de um experimento são muito mais sofisticados que de um consumidor padrão. O controle de qualidade, a durabilidade do produto que oferece, deve ser muito mais rígido do que a necessidade das pessoas que exigem nas lojas. Então as empresas aprendem muito de tecnologia e o dinheiro investido pelo país é um dinheiro que tem retorno. O dinheiro pago pela FAPESP no observatório e no CTA voltou para a sociedade brasileira. Nós acabamos de fazer agora o desenvolvimento de uma estrutura pro telescópio CTA que foi feito em uma empresa parceira em São José dos Campos. Nós passamos dois anos projetando uma estrutura com a empresa, que nunca fez um telescópio e eu não tenho a menor ideia de como fazer um calculo de estrutura, pois não sou engenheiro, os dois lados aprenderam, acabamos de fazer o desenvolvimento, construímos o protótipo, testamos no desenvolvimento a gente encontrou um problema que precisava de um instrumento de ajuste que não tinha no mercado, a gente desenvolveu esse instrumento e ele vai gerar uma patente no mercado agora e foi testado, qualificado, aprovado pela CTA e vamos fabricar 25 desses, to tomando orçamentos agora de empresas no Brasil inteiro que sabem fazer as estruturas para oferecer pro CTA.


quinta-feira, 9 de abril de 2015

CERN – Professores de Ensino Médio também podem - com Gláucia Grüninger




Entrevistamos a professora de ensino médio Gláucia Grüninger Gomes Costa. Ela possui graduação em Física (Bacharelado e Licenciatura) pela PUC, é professora de ensino médio e há dez anos é colaboradora de pesquisa na USP – São Carlos. Fez seu mestrado em espectroscopia de lente térmica e doutorado em equipamentos médicos na USP – São Carlos. Desenvolve material didático no formato investigativo, juntamente com o professor Tomaz Catunda.
Em um encontro de duas horas ela nos contou um pouco do projeto que leva professores do ensino médio para visitar o CERN, na cidade de Genebra, Suíça. O projeto é coordenado no Brasil pela Sociedade Brasileira de Física (SBF), com apoio da Diretoria de Educação Básica da CAPES e em parceria com o LIP (Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas), em Lisboa, o curso seleciona 30 professores de Ensino Médio do Brasil para uma visita ao CERN.
Para participar do programa é necessário passar pelo processo de seleção de professores, o que  implica satisfazer algumas exigências como:  estar lecionando no ensino médio; estar envolvido na Olimpíada Brasileira de Física; apresentar trabalhos em simpósios; manter algum vínculo com a Universidade;  e, fundamentalmente, demonstrar que abraça a causa do ensino de física no ensino médio. Gláucia nos explica ainda que, para um professor de ensino médio que  não mantiver algum vínculo com uma Universidade terá dificuldades em conseguir a vaga, pois necessariamente ele precisa ter produção acadêmica, o que no Brasil, no ensino médio é praticamente impossível. Glaucia desenvolve na USP lousas com lentes térmicas – espectroscopia.
A professora ainda levanta outro ponto muito importante que é o de envolver os alunos em eventos relacionados ao aprendizado de física, como, por exemplo, os minicursos de robótica. .  A Profa. Gláucia, mesmo reconhecendo as dificuldades envolvidas na participação de professores da educação básica em projetos voltados para a melhoria do ensino, reconhece ser essa participação de extrema importância:

“Se você é um professor que participa, seu aluno participa, você é o exemplo para seus alunos”.

Glaucia enfoca também que ela entende as dificuldades dos professores, principalmente por ela estar inserida neste meio, mas acredita que com esforços os professores são capazes de mudar esta cultura de não participação, para conseguirem melhorar a qualidade e a maneira como a profissão docente é hoje tratada.  Assim como acredita também que os professores de física, devem ter um amplo conhecimento de todo o conteúdo de física, desde física clássica até física moderna.
No ano que realizou a visita  foram apenas quatro professores do ensino médio e mais vinte professores universitários. Dentre esses quatro estavam ela, ligada à USP – São Carlos, um professor ligado à UNICAMP, outro ligado à USP – São Paulo e outro à UFRJ.
O Brasil, por não ser membro do CERN, participa do projeto na cota de professores de Portugal, o que num primeiro momento dificultou o convívio social dos brasileiros com os professores portugueses que entendiam, incorretamente, que Portugal financiava os brasileiros. Após algumas conversas eles entenderam que os brasileiros apenas estavam na cota do número de professores, assim como estavam todos os outros países falantes da língua portuguesa. Os vouchers e os seguros eram pagos pela SBF, Sociedade Brasileira de Física, também nos contou que havia uma pessoa encarregada pelos pagamentos, os gastos com condução e alimentação foram restituídos após apresentação dos comprovantes. Assim  para a vivência e viagem não houve gasto algum por parte dos professores.
A estadia deu-se em uma cidade localizada na França, Saint-Genis-Pouilly, bem próxima ao CERN que está localizado na cidade de Genebra, Suíça. Segundo a professora a experiência foi muito enriquecedora, desde andar de  ônibus à viajar e ter uma maior interação com as cidades a sua volta, na visão de Gláucia foi de grande valia. Na  cidade, as ruas possuem nomes de grandes cientistas, tal como Tesla e Albert Einstein.
Chegando ao CERN pelo domingo à tarde, já se iniciaram os cursos, que durante a semana foram ministrados no período da manhã, já o período da tarde era reservado para visitas técnicas. A grande educação e tratamento dos profissionais do local chamaram a atenção de Gláucia.  Durante um almoço, por exemplo, você podia sentar-se ao lado de um prêmio Nobel e ele iria se mostrar totalmente receptivo para conversar e falar sobre o trabalho que desenvolvia.  Inclusive era uma recomendação que na hora do almoço nos sentássemos ao lado de um desconhecido, pois assim poderíamos conhecer mais pessoas,  ter conversas e contato com cientistas e trabalhos distintos todos os dias.
Um ponto interessante foi saber que os professores portugueses, ao retornarem a Portugal, teriam uma prova teórica sobre os cursos desenvolvidos no CERN, que eram principalmente de física de partículas, e que para a continuidade de seu desenvolvimento eles deveriam ter um rendimento satisfatório. Bem diferente do Brasil, onde ela disse que em nenhum momento foi questionada pela sua Secretaria de Ensino sobre o que foi feito lá.
Porém a Gláucia optou por retornar este investimento feito a ela para a sociedade. Ministrou palestras, deu entrevistas a jornais e canais de TV, fez um relatório extenso e entregou à Secretaria de Educação. Mesmo não sendo cobrada a respeito, se sentiu na obrigação de dar retornou depois do investimento que o Estado fez na sua formação.
O único fato, dito na base de brincadeira, que desagradou Gláucia foi que ela apenas pode ir uma vez, pois de acordo com o programa, o professor pode ir uma única vez para assim dar oportunidade de participação a outros professores.
Em sua visita ela presenciou alunos poloneses, alemães e franceses fazendo visitas ao CERN. O principal enfoque do CERN é tentar despertar a vontade e curiosidade dos alunos para gostarem da área de ciências exatas, pois o número de engenheiros, químicos, astrofísicos, físicos e demais pesquisadores em exatas está caindo drasticamente.
Gláucia entende que deveríamos fazer algo semelhante no Brasil. Temos em Campinas o Laboratório Nacional de Luz Síncroton (LNLS)  onde os pesquisadores poderiam abrir suas portas e mostrar os trabalhos e pesquisas para assim atrair a atenção dos alunos para as ciências exatas. Diz que se cada diretoria de ensino levasse 20 alunos, o número de alunos interessados em ciências exatas na Universidade cresceria de forma significativa. Enquanto no CERN os pesquisadores querem abrir suas portas, no LNLS parece que os pesquisadores querem fechá-las. É esse tipo de pensamento que deveríamos mudar como cultura e incentivar nossos jovens para o desenvolvimento da ciência.

                   “Física para mim é a base do mundo”, Gláucia.