terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Entrevista - Possível descoberta do Bóson de Higgs e o LHC

Entrevista com o professor Nelson Studart do Departamento de Física da UFSCar - São Carlos, sobre a possível descoberta do Bóson de Higgs e o LHC. 

PET-LiF: Qual a importância da descoberta do Bóson de Higgs para a Física e qual a probabilidade dela estar correta?
Nelson: Primeiro a segunda pergunta: Qualquer descoberta é importante para a física, principalmente na parte de seus fundamentos. Então a importância deste achado, uma partícula de massa da ordem de 125GeV e que é um bóson é uma notícia muito alvissareira porque ela vem de encontro com um modelo já bem estabelecido e que tem muitas previsões confirmadas, o modelo padrão das partículas elementares. O que foi achado no LHC foram indicações fortes em dois experimentos acerca da existência de um bóson com energia nesta faixa. Isto não quer dizer que seja o de Higgs, pode ser que seja outro bóson, precisa-se de mais dados e experiências para se confirmar. O que acreditamos é que os resultados são factíveis e que foram muito bem testados e analisados estatisticamente porque tem muitos eventos e é preciso escolher aqueles que podem ser identificados com reações que produziriam o tal bóson. Você manda um próton para cima de outro próton, eles colidem e daí pode sair muitas coisas e até identificar os eventos, é um trabalho muito grande e leva muito tempo. 
Para a física, isto é uma contribuição muito importante que envolve muita gente, muitos grupos e muitos grupos independentes para não haver a possibilidade de um só grupo o encontrar. E então acredito que a importância dessa descoberta, se ela for comprovada nos próximos experimentos contribuirá para a solidificação do modelo padrão, e portanto é muito importante para a física. Isto não quer dizer que seja um ponto final porque existem atualmente vários modelos alternativos dentro do modelo padrão propriamente dito com variações. Esse é o mecanismo mais simples que foi proposto por Higgs e outros independentemente em 1963 de quebra de simetria na qual ele imaginou que existiria um mecanismo para que a força eletrofraca que é única a energias muito altas venha a se transformar na força fraca e na força eletromagnética, como conhecemos a energias mais baixas. E este mecanismo de Higgs, também é conhecido em várias outras áreas da física, de quebra espontânea de simetria, seria o que ele imaginou que faltava para fechar o modelo padrão: Por que existe massa? Por que foi produzida a massa? Essas são perguntas que ninguém sabem, no Big Bang poderia ter havido somente luz, pois o fóton não tem massa, então por que existem os elétrons, os prótons, os átomos e eles tem massa? Então a ideia é que existe um campo, que é o campo de Higgs, que geraria as massas das partículas, inclusive dela própria. 
PET-LiF: O senhor gostaria de acrescentar mais alguma coisa? 
NELSON: Você me perguntou primeiro a importância e segundo a exatidão. Essas experiências são muito cuidadosas, são testadas muitas vezes, por isso é que o cientista de ser, antes de tudo, um cético. Esta é a marca mais importante da ciência. Você tem que ter certo ceticismo, pois comprovações devem vir de vários experimentos. Tivemos outra notícia que não foi muito propagada, em que os norte-americanos também encontraram uma partícula com energia bem próxima a esta de Higgs. As estimativas de Higgs é que a partícula deveria existir em certa faixa de energia, da ordem de 120GeV a 250GeV. Então o que eles fazem na experiência, como tem muitos resultados, é selecionar eventos que ocorram nesses intervalos de energia, e o bóson de Higgs poderia aparecer de muitas maneiras, em prováveis decaimentos de partículas resultantes da colisão próton-próton. Se você notar, ele tem energia de 125GeV, calculando o tempo de decaimento desta partícula, basta dividirmos a energia pela constante de Planck que vai dar 10^-2 segundos, portanto é uma partícula que desaparece rapidamente decaindo em raios gama. Então é preciso ter muito cuidado para achá-la, mas temos um indicativo. Mas também se não a acharmos nós mudamos o modelo para outro mais fundamental, há vários concorrentes, este é apenas o mais simples. Como dizia Einstein, nós temos sempre que trabalhar com a simplicidade, pois se uma teoria simples explica, para que complicá-la?
O modelo padrão é baseado em campos e simetrias, então todas as partículas são representadas por campos e veja que o bóson de Higgs é o mediador da interação eletrofraca. Ora, o que é a interação eletrofraca? Apesar de ser eletrofraca, ela unifica a interação fraca com a eletromagnética, mas não apenas léptons, mas também hádrons massivos como o próton e o nêutron participam. No decaimento beta, que é decaimento radioativo fundamental da interação fraca, onde um próton vira um nêutron ou um nêutron vira um próton, envolve características diferentes do quark, que é o quark charmoso que muda de estranho. 
Diferentemente para formar o próton em que um quark é o up e o outro é o down. Então tem que aparecer este mediador, assim como o glúon é o que liga um quark a outro, e o fóton que é o mediador da interação eletromagnética. As interações fracas que são mediadas pelos W+, W- e o Z que já foram descobertos. Então falta essa partícula mediadora da interação eletrofraca, e ela é massiva, diretamente do fóton. Agora uma coisa interessante é que o mecanismo de Higgs só se manifesta nas partículas mais elementares. Por exemplo, o próton é uma partícula composta de quarks e nesse sentido não seria tão “elementar”. 
Para tornar a coisa mais simples de explicar o uso das analogias, é apropriado, pois já é difícil de explicar o que é o campo. Mais ainda, o campo eletromagnético decai com a distância, e o gravitacional também, mas o campo  de Higgs não, ele existe em todo lugar e é constante. Então, como eu gosto de história, poderia se dizer que ele é um novo tipo de éter, pois existe em tudo universo, em todo espaço tempo, inclusive no vácuo. E como o bóson de Higgs gera massa? A partir da interação entre eles. Existem algumas analogias interessantes que os jornalistas e físicos utilizam para transmitir uma imagem simples do mecanismo de Higgs, como exemplo, destacamos duas analogias usadas para explicar  melhor o Boson de Higgs, são elas: 
In the Air 
Um exemplo elegante em sua simplicidade, foi elaborado pelo professor de Rutgers Matt Strassler comparando o campo de Higgs com o ar. 
O que é o campo de Higgs, e como devemos imagina-lo? É como o invisível para nós, e passa despercebido por nós, como o ar é para uma criança, ou água para um peixe, na verdade, mais ainda, porque apesar de saber, à medida que crescem, somos conscientes do fluxo de ar sobre nossos corpos,  detectado pelo nosso sentido do tato, mas nenhum de nossos sentidos nos fornecem qualquer acesso ao campo de Higgs.


Crowded Room

Imagine uma sala cheia de físicos. De repente Einstein entra e tenta atravessar a sala, mas um bando de físicos tietes em torno dele o impedem de se movimentar, efetivamente aumentando sua massa. Agora imagine se eu entrar na sala, como um estudante de graduação humilde, ninguém vai querer interagir comigo, então vou passar pelos físicos relativamente desimpedido-sem massa efetiva para mim! Por fim, imagine que alguém sussurre um rumor, fazendo os físicos se agruparem com entusiasmo por conta própria.
Nesta analogia, a sala cheia de físicos representa o campo de Higgs no espaço, Einstein representa uma partícula com massa alta, eu represento uma partícula com massa baixa (ou nenhuma massa), e um grupo de físicos representa uma excitação do campo, que é efetivamente um bóson de Higgs.